quinta-feira, 17 de maio de 2018

Por que a Abolição da Escravatura não é comemorada?

     Em 15 de maio de 2018 a Lei Áurea completou 130 anos. É um marco importante na história do país que foi o último do Ocidente a abolir a escravidão. Entretanto, essa não é uma data lembrada com facilidade pela população, muito menos comemorada e isso tem um motivo bem simples. Cento e trinta anos depois de ser liberto, o negro ainda não é visto como igual na sociedade.

     No ano de 1888 foram libertos os negros escravizados que ainda não tinham sido "beneficiados" com uma das chamadas Leis para inglês ver. Só não se iluda achando que os Ingleses eram boa gente e presavam pelo bem estar dos negros, na verdade eles queriam apenas ter mais pessoas para quem vender seus produtos e já que escravo não tem salário ele não consome, ou seja, não servia aos propósitos do mercado e impedia o Brasil de fazer relações comerciais, algo essencial para ser visto como país desenvolvido. Um exemplo das medidas usadas para alegrar os ingleses foi a Lei do Ventre Livre, esta concedia uma pseudo liberdade para os nascidos após 28 de setembro de 1871,  já que as crianças que eram 100% dependentes de suas mães que continuavam em condições de escravidão e acabavam ficando com elas nas senzalas e sendo tratados como qualquer outro escravo e já que comiam e bebiam da comida dos senhores escravistas lhes era atribuída um tipo de dívida.

     Outra medida pseudo libertária foi a Lei do Sexagenário que a partir de 28 de setembro de 1885 libertou os poucos escravos com mais de 60 anos que existiam, ou seja, os escravos que já não tinham forças para realizar os trabalhos pesados que lhes eram exigidos, fazendo na verdade com que os senhores de escravos apenas tivessem uma desculpa para largá-los na sarjeta.

     A Lei Áurea lançou na sociedade uma superpopulação de negros que não tinham onde morar, o que comer, não eram alfabetizados, não tinham uma profissão, uma história ou uma identidade já que tudo que lhes caracterizava como povo ficou na África. Agora eles eram apenas ex-escravos. Vistos como a escória após séculos sendo chamados de preguiçosos, ignorantes, ladrões e rebeldes. Eles foram simplesmente abandonados à própria sorte no mundo que foi construído com o suor de seus rostos, mas que não tinha espaço para eles. Já os ex-proprietários de escravos, receberam indenizações por cada escravo liberto, já que segundo lhes parecia, o Estado estava lhes desapropriando de um bem e eles não poderiam ficar com o prejuízo.

     Hoje, em pleno Século XXI, ainda sentimos as consequências dessa libertação feita nas coxas, sem planejamento ou sequer intenção de integração dos recém libertos. Vemos os negros compondo a maior parte da população de rua, ocupando a maior parte das unidades penitenciárias, a maior parte dos postos de trabalho subalternos e sendo os mais sujeitos a morrer de forma violenta. Ainda assim, um grupo insiste em dizer que os negros reclamam atoa, que deveríamos agradecer aos brancos por termos sido arrancados da Africa já que lá, segundo eles, só tem miséria e que essa tal Dívida Histórica é uma desculpa para tentar arrancar privilégios do governo.

     O negro é constantemente suspeito, seus traços físicos como cabelo e nariz são inferiorizados, não lhe é permitido ser protagonistas de  uma novela que se passa em um Estado com 82% da população negra, durante muitos anos foram excluídos das vagas nas faculdades e quando lhes foi garantido o direito a frequentá-las passaram a lhes chamar de vagabundos. Pois cento e trinta anos depois, o mundo ainda não está pronto para nós e é por isso que ao contrário da assinatura em um papel, cada espaço alcançado é comemorado. Cada negro que se forma, que tem a excelência de seu trabalho reconhecida, que chega onde nenhum de nós havia chegado, nos mostra que é possível e isso importa. Representatividade Importa!

     Como declarou por meio de seu twitter o ex-ministro da cultura Gilberto Gil, "Precisamos vivenciar uma nova extinção da escravatura, que transcenda o corpo da lei e faça prevalecer o seu espírito. Uma abolição que não fique só no papel, que conquiste as consciências". Essa também é a minha Humilde Opinião.

Ass: Bruno Santos

FONTES:

sábado, 5 de maio de 2018

Estraga Prazeres


No ano de 1895, o primeiro documentário em curta metragem na história do cinema foi exibido pelos irmãos Lumière, o que lhes conferiu o título de primeiros cineastas. Desde então essa forma de arte vem surpreendendo e encantando gerações.


Roteiro, atuação, fotografia, efeitos especiais, cenário, sonoplastia, direção, etc. É grande a quantidade de profissionais envolvidos no processo que coloca um filme no cinema. Atualmente, existe toda uma indústria que movimenta bilhões ao redor do mundo, gerando entretenimento para a população disposta a pagar o preço que - ao passar do tempo - só aumenta nas bilheterias. Entretanto, esse texto não tem como objetivo falar da indústria cinematográfica em si, a intenção é falar sobre outra coisa...

Eu nasci nos anos 90. Assisti Digimon e Dragonball Z na extinta TV Globinho, desenhos cujo final de cada episódio era marcado por prévias do que aconteceria no próximo e cujo nome de cada episódio já era um grande spoiler, como por exemplo "Goku se sacrifica! Só existe uma chance!", "Morre Vegeta! Um orgulhoso Saiyajin" e "Goku finalmente se transforma no Lendário Super Saiyajin". Sinceramente, isso não me incomodava nem um pouco na época, entretanto, nós crescemos e nossas perspectivas sobre algumas coisas se modificam. Um certo filme foi primordial para mudar o meu ponto de vista sobre isso.



Duas pessoas acordam em um banheiro, elas estão acorrentadas, em uma televisão um boneco macabro lhes passa instruções sobre o que devem fazer para sair de lá e diz a icônica frase "Que os jogos comecem". Sim, Jogos Mortais mudou minha visão sobre spoiler. A experiência que aquele filme me proporcionou me fez pensar no quanto eu perderia se eu conhecesse seu desfecho antecipadamente. Sentimento que se renovou quando eu assisti o filme Clube da Luta. Quem assistiu sabe do que estou falando! A vontade de ver o filme novamente para poder prestar atenção no que não tinha visto antes é empolgante e é a esse ponto que quero chegar.

Filmes mexem com emoções, nos fazem ver os personagens como pessoas, coloca-nos no lugar deles. Não se trata apenas de uma experiência audiovisual, mas de uma experiência de introspecção, de olhar para nossas próprias vidas através da vida de um personagem fictício e rever conceitos, princípios e práticas. Bem, isso falando de um filme de cerca de uma hora e meia, no máximo três horas de duração. Agora vamos mudar de patamar.

Falemos de um universo, com dez anos de existência, com atores que interpretam os mesmos personagens há tanto tempo que fica difícil dissociá-los. Personagens por quem se tem carinho, admiração e respeito. Cargas emocionais altíssimas. Bem, tudo isso existe em Vingadores: Guerra Infinita.

Um filme de Blockbuster que não pretende ser educativo nem sequer concorrer a um Oscar. Só quer vender ingressos e todos os produtos possíveis e imagináveis que levem a sua marca. Parece uma bobeira para você que façam jejum de internet para evitar saber o que vai acontecer no filme? Para mim não, pois isso tem a ver com a experiência individual da pessoa com o filme.

Para alguém que espera a continuação de uma história há meses ou que leu os quadrinhos e espera para ver aquilo no cinema há anos, um spoiler equivale a uma invasão, como se você abrisse o exame e dissesse o sexo do filho dele antes da hora. Se você teve a sorte de ver um filme na estréia, não prejudique a experiência do seu colega. Deixe ele desfrutar de cada cena, rir de cada piada e se surpreender com o final da mesma forma que você pôde.


Quem dá spoiler é carente e quer chamar atenção, mas essa é apenas a Minha Humilde Opinião.

Ass:

Bruno Santos

Fontes:


domingo, 21 de janeiro de 2018

Só uma opinião de leve.

     Hoje o dia acordou triste para muitos jovens brasileiros. O motivo? Suas notas baixas no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), que os deixaram um pouco mais longe do sonho de cursar uma faculdade. Para mim, o dia amanheceu triste por outro motivo: eu assisti o clipe da versão light  de "Só Surubinha de Leve". É meus amigos, a curiosidade não matou o gato, ele se suicidou de tanto arrependimento. Mas, já que eu me submeti a isso, que ao menos sirva para embasar uma reflexão. Afinal, com toda tribulação vem uma lição.

     Vivemos em um país onde um " artista" divulga a descrição clara de um estupro em ritmo festivo e descontraído, mas acha o ato tão normal que, quando as pessoas criticam negativamente, ele pensa que a causa é o fato dele não levar a vítima para casa depois. Ou seja, embebedar mulheres, drogá-las ou até dar o famoso "boa noite Cinderela" e usá-las como objeto sexual (talvez até em uma orgia) é normal, mas descartá-la em um beco escuro qualquer já é demais... gênio!


     Era de se esperar que em pleno Século XXI os homens tivessem se dado conta que manter relações sexuais com uma garota drogada ou embriagada se qualifica como estupro, mesmo com o "consentimento" dela. Consentimento entre aspas, tendo em vista que ela não está sob perfeitas condições de raciocínio para a tomada de decisões. Homens que se valem desses recursos para alcançar suas pseudo conquistas demonstram apenas que possuem mentes perversas, incapazes de conquistar uma mulher através de uma conversa, por exemplo. Incapazes de se conformarem com a ideia de que pode não haver conquista. Que pode haver um ''não'' por parte das mulheres e que isso deve ser respeitado.



     Tendo dito isso, vale ressaltar que essa música em particular nem é uma das mais pesadas do funk carioca, por incrível que pareça! Existem relatos de abusos bem mais completos e chocantes, relatos de pedofilia e abandono, alguns baseados em fatos reais. Estas músicas tocam frequentemente nas comunidades periféricas do nosso Estado, onde - aparentemente - não incomodam tanto. Claro que o aumento do acesso à informação está levando o funk para todas as partes do Brasil e do mundo, que este mesmo acesso está desenvolvendo um senso crítico sobre o que consumimos e ouvimos e sem dúvida nos possibilita um posicionamento em relação a isso.



     Entretanto, não é de hoje que músicas com letras pesadas e boas batidas, caem nas graças do povo. Muitas delas já ganharam versões light para serem veiculadas nos meios de comunicação de massa. Para citar as mais recentes, que tal ouvir a música "Bem Querer" do MC Livinho? Ou ''Baile de Favela'', do MC João e "Mama", do MC Catra e Valesca Popozuda. Ou uma das músicas mais escutadas em 2017: a "Deu Onda", do MC G15. No final do texto tem um link com as versões originais e modificadas das mesmas. 



     Por coincidência - ou não - todas estas músicas estavam em alta quando o Senado vetou o projeto de Lei que tornaria o funk "um crime contra a saúde pública de crianças, adolescentes e à família". Será que a votação teria um resultado diferente se acontecesse amanhã? O Projeto de Lei criado por Marcelo Alonso, um webdesigner de São Paulo, alegava que os bailes funk são redutos de criminosos, estupradores e pedófilos, e que visava apenas atendê-los e ajudá-los no recrutamento de jovens e adolescentes, além de incentivar o uso de drogas e álcool. O Relator do caso, o Senador Romário(Pode-RJ) afirmou que o projeto era inconstitucional por cercear a livre manifestação cultural e de pensamento.

     Porém, não é de hoje que o Funk tem problemas com a justiça. A música "Um Tapinha Não Dói" de autoria de MC Naldinho (letra) e Dennis DJ, foi gravada por Naldinho & Bela para o álbum Furacão 2000 - Tornado Muito Nervoso 2, no início dos anos 2000. A canção logo se tornou um sucesso, inclusive internacionalmente. Em 2003, uma ação foi ajuizada pelo Ministério Público Federal e pela ONG Themis Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero contra a música, por considerarem que "ela banaliza a violência contra a mulher, transmite uma visão preconceituosa contra a imagem da mesma, além de dividir as mulheres em boas ou más conforme sua conduta sexual". Em 2010, depois de sete anos de tramitação na Justiça Federal, a empresa detentora dos direitos da música (Furacão 2000 Produções Artísticas Ltda), foi condenada, em primeira instância, a pagar uma multa no valor de R$ 500 mil. Em 2013 - 3 anos após a condenação - o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (Rio de Janeiro) absolveu a empresa Furacão 2000 após o desembargador federal Cândido Alfredo Silva Leal Júnior considerar que "letras de funk como a desta música podem até ser de mau gosto, mas não incitam a violência".

  Enquanto eu me esforçava para chegar ao fim do clipe do MC Diguinho, muitos pensamentos passavam pela minha mente. Será que as garotas que ouvem e dançam essa música em casa ou em uma balada possuem clareza sobre o que está sendo tratado? Ou elas apenas dançam como dançariam qualquer música em inglês mesmo que não soubessem o que está sendo dito? Essa música, que já foi retirada do Spotify, alcançou a marca de 14 milhões de visualizações no YouTube. Teve quem ouviu e achou graça, quem sentiu nojo, quem se manifestou e quem se identificou. Por mais reprovável que seja, essa música exprime uma realidade.

     Mulheres sofrem abusos todos os dias! E agora as pessoas estão falando sobre isso. Não era a intenção do artista, certamente, mas está servindo para isso e essa conquista deve ser explorada. Afinal, é uma discussão importante conseguindo espaço na mídia. Tenho a esperança que esse episódio servirá para que mais homens se conscientizem sobre seus atos, que mais mulheres escutarão de forma crítica as músicas que estão dançando e que os artistas encontrarão o equilíbrio entre o poético e o ofensivo. Mas, essa é apenas a Minha Humilde Opinião. 

Ass: Bruno Santos


Fontes: